Um cansaço estranho.Uma vida de espera.
Era como se toda a existência fosse uma espera sem entender bem o porquê.
Havia dias que os livros não o satisfaziam e tampouco o melhor da música italiana, que aliás ele sabia de cor.
Uma pessoa agradável.
Um professor universitário de sucesso.
Seus alunos quase o idolatrava ,só não o faziam ,pois ele mesmo não aceitava.Sua filosofia era que cada um tinha o
melhor para oferecer e quando isso acontecia a humanidade ficava um pouco mais rica.
Aos domingos de manhã caminhava devagar por todo o campus e amava tudo aquilo, e quando alguém o perguntava o motivo
de passear em um lugar onde todos os dias ia trabalhar ele dava um leve riso e dizia que era mania de velho.
Mas,nem ele mesmo sabia o que encantava tanto aquele pedaço de chão.Talvez fossem os beijos dobrados e de cores variadas
ou quem sabe o conjunto arquitetônico de obras modernistas e contemporâneas e até mesmo as pessoas que fizeram do campus um
local de caminhada.Ele não sabia,mas amava tudo aquilo.Uma cidade dentro da outra.Um escola que se transforma em um parque urbano.
Lembra muito bem do dia em que ali chegou.Um jovem com a bagagem cheia de esperança e os bolsos furados e vazios.
Viera movido pela ânsia de ser alguém na vida,estudar e retornar a sua pequena cidade e ajudar seus pais,que diante da possibilidade de ter
de ter um filho estudando em uma das melhores escolas,coisa que só filhos de ricos conseguiam,eles desdobraram nos afazeres,
O pai aumentou a horta e de sol a sol plantava,colhia e vendia seus produtos.A mãe por sua vez aumentou a produção de suas compotas e doces
e todos os sábados ela os vendia na feira.E todo sacrifício para poder comprar o essencial para a viagem .
Na véspera, o pai o levou de charrete até a casa de uma parente onde ele pernoitaria e no dia seguinte pegaria o trem com destino a Belo Horizonte e de lá um ônibus e depois outro.
Quase dois dias de viagem.O embornal de quitutes o salvara da fome.O tempo passou,mas a saudade dos quitutes,da farinha de amendoim socada no pilão que ficava
na varanda de chão batido ainda faz encher de água a boca daquele poeta-professor que todos os domingos ousa sentir saudades.
E o amor?
Ah ! Esse sentimento o fazia rir,chorar,cantar,sofrer.Talvez ,para ele somente os pais o amaram.O amor mete medo na gente,ele dizia aos companheiros do pequeno quarto que dividiam.
E ria,como uma criança que acabara de um carrinho de rolimã.E ele teve um feito por um tio paterno.Foi um dos dias mais felizes de sua infância.
Amor faz a gente chorar.Lembra muito bem o dia em que retornou a casa dos pais.Abraçou os dois e chorou,chorou como quem não sabia fazer outra coisa do que chorar de saudade.
O consolo vinha das cartas verdadeiramente mal traçadas linhas,que se transformavam em preciosidades lidas e depois relidas até a chegada de outra.Seus pais desabafavam a saudade naquelas cartas onde
de tudo se falava até da gatinha Mimi.(naquela época os gatos não tinham nomes de gente).
As cartas também o faziam cantar,assoviar,mas ao mesmo tempo aparecia uma tristeza, uma vontade de voltar ao aconchego do lar e assim o amor o fazia sofrer.
Quando ele dizia ter medo do amor não era um simples medo,era uma dor estranha que o invadia,como se sufocasse todo o seu ser.
Ele sabia que aquilo precisava ser vencido.Ninguém nasceu para ser sozinho.Ele também queria amar e ser amado,mas havia algo que o impedia ,uma estranha sensação que seu amor não se encontrava nessa dimensão,mas que produzia uma dor tão grande,uma saudade sem ao menos saber de quê.
O domingo passa tão rápido e ele caminha para chegar na rua da cidade.
Viveu novamente a sensibilidade de querer e não querer ao mesmo tempo.
Almoça no mesmo local há anos.
Volta para casa e sente que está passando pela vida.
Sua cidade no norte de Minas ainda continua pequena.Lá estão sepultados seus únicos amores.
Amanhã é segunda-feira.Tudo se renova neste longo dia.
É vida que segue.
E outros domingos virão.
Uma proximidade tão grande. É o corriqueiro que nos possibilita enxergarmos nossos maiores conflitos.
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