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sexta-feira, 23 de março de 2018


Como sentir falta de algo que nunca teve?
Naquele dia,ao sair de casa para o trabalho,ela um pouco atrasada,entra correndo no coletivo que a levaria até ao trabalho.
Senta-se perto de um rapazinho,que poderia ser seu filho.Ela nunca teve um filho e do nada sente um aperto no peito,fecha os olhos e vem uma imagem distorcida de um dia de inverno,em um lugar que nunca tinha ido,um caminho estreito como ela mesma percebia não caber tanto sentimento ali.Um lugar estranho e mágico.Por um momento permitiu ,que os devaneios tomassem conta de todo o seu ser.Não estava mais a caminho do trabalho,pelo contrário,estava em um lugar de silêncio,onde casebres eram enfeitados por lustrosas de cores variadas,sabia que aquelas flores tinham um nome mais chique,mas era aquele nome que ela conhecia.
Em seus devaneios ela sentia que não estava só,que alguém emanava uma força tão forte,que a ajudava a perceber uma beleza imensa daquele simples lugar.
Havia uma música tão saborosa que a lembrava daquele xícara antiga que tinha o gosto de um café feito na hora e o aroma que parecia pertencer ao passado.E de repente ela percebeu,que aquela xícara tinha uma linda história de amor vivida por sua avó,que a deixara como recordação de uma vida feliz.Lembra com um sorriso,quando cada uma de suas irmãs havia ganhado uma xícara de sua avó.Para ela aquela peça era infinitamente bela,pois sabia a história por detrás daquela porcelana,frágil que a vida insistiu em conservar.De repente suas lembranças se quebram e um susto enorme a faz acordar,está em um ônibus.
Próximo ponto terá que descer.
O dia parecia não passar.Um terrível pressentimento invadira sua alma.Não sabia o quê.
De volta,não conseguiu nem fechar os olhos,a vontade era de chegar rápido em casa.
Precisava verificar algo,mas tinha um medo estranho.
Desce próximo ao seu apartamento,no elevador foi tomada de um sentimento estranho,uma vontade de chegar e partir ao mesmo tempo.
Entra,coloca sua bolsa no sofá e vai até sua cristaleira antiga,que tinha sido de sua mãe,um móvel que não combinava com a decoração,mas para ela era o mais importante,pois revelava, nos objetos ali guardados,muita recordação.
E em um momento seu coração se alegra,pois intacta estava aquela xícara,que por um instante pensara ter se quebrado naquele vendaval de sentimentos,que por esquecimento deixara aberta a janela do apartamento de sua alma.

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Membro fundador da Academia Inhapiense de Letras